17/11/2017

Petição pela atribuição ao cagarro (Calonectris borealis) do estatuto simbólico de Ave Regional dos Açores




PETIÇÃO PELA ATRIBUIÇÃO AO CAGARRO (CALONECTRIS BOREALIS) DO ESTATUTO SIMBÓLICO DE AVE REGIONAL DOS AÇORES

O cagarro ou pardela-de-bico-amarelo-atlântica (Calonectris borealis) é uma das aves mais emblemáticas dos Açores, presente em todas as ilhas do arquipélago.

É a ave marinha mais abundante nas nossas ilhas, sendo o nosso arquipélago o principal e mais importante baluarte de nidificação desta espécie. Nas nossas ilhas concentra-se cerca do 75% do total da sua população mundial, estando localizadas as restantes colónias no arquipélago da Madeira, nas ilhas Canárias e no litoral continental de Portugal.

O cagarro é uma ave que desde sempre se encontra fortemente ligada ao imaginário cultural dos açorianos. Ela simboliza melhor do que qualquer outra ave a simbiose entre o meio marinho e o meio terrestre que caracteriza os Açores e as suas gentes. Durante todo o período de nidificação das aves, que vai de abril a novembro, o canto singelo e misterioso dos cagarros enche as noites da primavera e do verão por todo o litoral dos Açores. Para os pescadores, que seguem no mar ao longo do ano os seus voos e as suas pescarias, os cagarros servem de ajuda para localizar os cardumes e aumentar o rendimento das suas pescas.

Os cagarros são também os protagonistas da campanha de conservação da natureza com mais sucesso e que mais pessoas mobiliza em todos os Açores. Desde o ano de 1995 realiza-se por toda a região a Campanha SOS Cagarro, destinada ao salvamento dos cagarros juvenis que no seu primeiro voo caem em terra, desorientados por causa das luzes artificiais. Assim, todos os anos, nos meses de outubro e novembro, a Campanha SOS Cagarro mobiliza o interesse e o entusiasmo de milhares de açorianos. Desde os seus inícios há cada vez mais pessoas a participar. Nos últimos anos foi registada a participação de até 4.600 voluntários e de cerca de 315 entidades em toda a região. O seu empenho e esforço servem para resgatar anualmente um elevado número de aves, por vezes superior a 6.000 exemplares.

Tem vindo a crescer, ao mesmo tempo, uma grande sensibilidade e preocupação, por parte de diferentes entidades sociais, pela conservação e futuro desta ave. Desta forma, no ano de 2014, diversas associações ambientalistas e ecologistas assinaram um “Manifesto em defesa do cagarro” no qual era já reivindicada “a declaração do cagarro como Ave Regional, de especial interesse e protecção na Região Autónoma dos Açores”. No referido manifesto era argumentado que “ainda que nos Açores existam outras aves que seriam candidatas a este título, esta espécie é a mais abundante em todas as ilhas, a mais próxima das populações e aquela cuja protecção melhor serviria para a protecção do conjunto dos ecossistemas litorais de todo o arquipélago e de outras aves marinhas ameaçadas”.

Na altura do lançamento do manifesto, as entidades governamentais mostraram simpatia pelo proposto. Com efeito, em carta da Direção Regional dos Assuntos do Mar aos promotores do manifesto, foi-lhes comunicado que “a proposta de criação da figura de “ave de interesse regional” encontra-se sob apreciação das Direções Regionais dos Assuntos do Mar e do Ambiente e da Universidade dos Açores”. Apesar disto, não foram conhecidos, até agora, mais desenvolvimentos.

Cada vez é mais evidente, aquém e além-fronteiras, que a harmonia e convivência entre o homem e a natureza é o único caminho para nos garantir um futuro próspero e sustentável, nomeadamente num meio insular tão pequeno como o açoriano, onde essa relação entre homem e natureza é tão estreita. Mas é também evidente que a conservação da natureza passa, antes de mais, por inculcar na consciência colectiva da população o respeito pelo meio natural e por valorizar socialmente todos elementos que constituem a fauna e a flora nativas.

Sendo o cagarro, como foi dito, um elemento emblemático da natureza na nossa região, a sua valorização social será também a valorização do conjunto da natureza açoriana. A sua protecção será também a protecção do conjunto dos ecossistemas marinhos das nossas ilhas. E o respeito por esta espécie será também, em parte, o respeito pela geografia, pela história e pelo modo de vida do povo açoriano. Assim, a elevação do cagarro a ícone oficial dos Açores, ao mesmo nível de outros símbolos da região, será a melhor forma de elevar e materializar os valores antes citados a um novo e mais avançado patamar, ficando para sempre ligados, de forma espontânea, a um sentimento de orgulho entre todos os açorianos.

Mas se os ícones nos servem para dar uma nova dimensão à imagem que temos de nós próprios e do nosso modo de vida, eles servem-nos igualmente para projectar uma determinada imagem da nossa terra no exterior e entre as pessoas que nos visitam. Assim, com a associação dum símbolo natural como o cagarro aos elementos de identidade próprios do povo açoriano, o nosso arquipélago ganharia sem dúvida em estima, simpatia e prestígio entre todos os povos desenvolvidos onde a natureza é igualmente cada vez mais valorizada.

A atribuição ao cagarro do título simbólico de Ave Regional dos Açores, podendo trazer tantas vantagens, não comportaria na realidade nenhuma mudança legal no seu actual estatuto de protecção, nem afectaria à importância que é dada a outras aves igualmente emblemáticas da região, nem obrigaria à realização de quaisquer acções especiais por parte das entidades governamentais, para além daquelas que já são feitas. Com esta declaração trata-se simplesmente de outorgar uma nova dignidade a esta ave e, com ela, a todo o conjunto da natureza e do povo açoriano.

Por todo o anteriormente exposto, solicita-se que a região institua o cagarro ou pardela-de-bico-amarelo-atlântica (Calonectris borealis) como Ave Regional dos Açores.


Assine a petição aqui: http://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=PT87499






08/11/2017

Comunicado: Associações ecologistas açorianas e mais de 350 pessoas manifestam-se pela defesa das aves açorianas e contra a sua caça


Associações ecologistas açorianas e mais de 350 pessoas manifestam-se pela defesa das aves açorianas e contra a sua caça

Várias associações e colectivos ecologistas açorianos manifestam-se pela defesa das aves nativas dos Açores e subscreveram o “Manifesto pela defesa das aves açorianas e contra a sua caça” (http://avifaunadosacores.blogspot.pt/2017/10/manifesto-pela-defesa-das-aves.html).

Este Manifesto conta com as assinaturas dos Amigos dos Açores, da Quercus/São Miguel, do Coletivo Açoriano de Ecologia Social, da Avifauna dos Açores, e de mais de 350 pessoas individuais que já assinaram uma petição de apoio ao Manifesto disponível na plataforma change.org (https://www.change.org/p/assembleia-legislativa-da-regi%C3%A3o-aut%C3%B3noma-dos-a%C3%A7ores-manifesto-pela-defesa-das-aves-a%C3%A7orianas-e-contra-a-sua-ca%C3%A7a).

O Manifesto critica e pede a retirada da actual Proposta de Decreto Legislativo Regional sobre o exercício da caça nos Açores, apresentada recentemente pelo Governo, por considerar que esta proposta legislativa não está apoiada num grau suficiente de conhecimento científico, por não respeitar o cumprimento dos tratados internacionais e por não proteger de forma satisfatória nem adequada a frágil natureza dos Açores.

Indo ao encontro das mesmas reivindicações apresentadas também num recente comunicado pela Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), os subscritores do Manifesto consideram que se devem excluir definitivamente da lista de espécies cinegéticas as aves nativas que apresentam um estado de conservação desfavorável, como a narceja ou a galinhola, as aves migradoras que utilizam os nossos escassos e valiosos habitats aquáticos, como o pato-real, a marrequinha e a piadeira, e as aves de origem exótica, como a perdiz-vermelha e a perdiz-cinzenta, que mesmo por razões legais nunca deveriam ser introduzidas na nossa região.

O Manifesto alerta também para o facto de quatro aves migradoras protegidas estarem fortemente expostas à caça pelo facto de serem praticamente impossíveis de diferenciar de outras quatro incluídas actualmente na lista de espécies cinegéticas. Também se pede a proibição da utilização na caça de aves de presa e do furão, uma espécie exótica invasora nos Açores.

Os assinantes do Manifesto salientam que a caça de aves açorianas, praticada por uma minoria de caçadores, é altamente subsidiada com dinheiro, equipamentos e funcionários públicos, sendo que o seu escasso benefício contrasta claramente com o impacto negativo que exerce sobre outras actividades económicas mais importantes para a região, como é o caso do turismo. Um impacto que é ainda maior quando a caça é praticada na proximidade dos trilhos pedestres ou nos meses do verão, quando a presença de turistas é maior.

Face às recentes declarações da Directora Regional dos Recursos Florestais tratando de desvalorizar publicamente o conteúdo do comunicado da SPEA, lamentamos a insistência do Governo Regional em ignorar o conhecimento científico existente e em continuar a defender opções ambientais caducas e erradas.

Consideramos muito alarmante que o Governo considere, por exemplo, que os apenas 6-10 casais de narceja existentes na ilha de São Miguel possam ser considerados como uma população estável e vistos como um recurso cinegético sustentável.

Igualmente alarmante é considerar que não há possibilidades de confusão e de caça de espécies protegidas quando sabemos, por exemplo, que 8% das narcejas caçadas no Pico e até 56% das caçadas em São Miguel são na realidade narcejas-americanas, existindo portanto comprovadamente uma confusão contínua e flagrante entre espécies protegidas e cinegéticas.

Também é muito preocupante a insistência em não considerar o furão como uma espécie invasora, as aves de presa como espécies exóticas ou confundir a situação e o estado de conservação das espécies nativas no meio continental europeu e no meio insular açoriano.

Não temos dúvidas de que, com a definitiva proibição da caça das aves nativas açorianas, uma actividade muito minoritária e com um alto impacto sobre o ambiente e sobre outros sectores económicos como o turismo, a região seria grandemente beneficiada.





25/10/2017

Manifesto pela defesa das aves açorianas e contra a sua caça





MANIFESTO PELA DEFESA DAS AVES AÇORIANAS E CONTRA A SUA CAÇA


Perante a nova Proposta de Decreto Legislativo Regional intitulada “Novo Regime Jurídico da Gestão dos Recursos Cinegéticos e do Exercício da Caça na Região Autónoma dos Açores”, recentemente apresentada pelo Governo na Assembleia Legislativa Regional, as pessoas e organizações ecologistas assinantes querem manifestar:

O seu grande descontentamento pelo facto de não ter sido considerado nem aceite nenhum dos pontos recomendados ao Governo Regional pelas diferentes organizações ecologistas, nos diversos pareceres que aquele previamente lhes solicitou.

A sua surpresa pelo facto desta nova proposta continuar a insistir numas ideias sobre a natureza das ilhas e sobre a actividade cinegética completamente alheias à realidade dos Açores, aparentemente copiadas da realidade que é própria do continente.

O seu grande pesar pelo facto da conservação da natureza ser novamente preterida e esquecida em favor de determinados interesses particulares, ficando novamente a natureza, que é o bem comum de todos os açorianos, subordinada aos interesses de uma minoria de cidadãos.

O seu pesar pelo facto dos Açores perderem mais uma oportunidade de se converterem numa referência internacional no respeito pela natureza e pelo ambiente, em grande contradição com os esforços feitos ultimamente para promover a nossa região como um destino turístico de natureza.

Pensamos que a nova proposta deveria no mínimo contemplar de forma científica e rigorosa as características próprias das espécies que se pretende classificar como cinegéticas. Neste momento a proposta inclui dez espécies, algumas das quais próprias da fauna açoriana e outras não, sem fazer nenhuma consideração a este respeito, à sua abundância, ao seu estado de conservação ou à sua importância ecológica. As espécies incluídas são um mamífero exótico (coelho-bravo), duas aves exóticas (perdiz-vermelha, perdiz-cinzenta), três aves nativas residentes (narceja, galinhola, codorniz), três aves nativas migratórias (pato-real, marrequinha, piadeira) e uma ave talvez nativa ou de origem doméstica (pombo-das-rochas).

Constatamos ainda que na nossa região a actividade cinegética está centrada de forma principal e maioritária na caça ao coelho-bravo, sendo a caça às restantes espécies, todas elas aves, uma actividade claramente minoritária e difícil de justificar quando é considerado o elevado impacto ecológico e ambiental que ela provoca.


O coelho-bravo, uma espécie exótica invasora

O coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus) é o principal recurso cinegético da região. No entanto, na proposta continua a ocultar-se a autêntica realidade desta espécie: o facto de ser uma espécie que foi introduzida nos Açores com a colonização portuguesa, estando desde então presente em todas as ilhas açorianas à excepção da ilha do Corvo. O coelho-bravo não é portanto uma espécie própria dos Açores e, como em muitos outros lugares onde também foi introduzida, na nossa região está classificada como sendo uma espécie exótica invasora.

Como tal, o coelho-bravo é responsável por enormes e permanentes danos na flora açoriana e por ter contribuído em grande medida para a destruição dos habitats e ecossistemas nativos, assim como para a transformação da paisagem original das ilhas. De facto, os trabalhos científicos consideram o coelho-bravo como uma das cem piores espécies exóticas invasoras dos Açores (Silva, Ojeda e Rodriguez, 2008), mas também a nível mundial (União Internacional para a Conservação da Natureza, 2000).

Para além disso, o coelho-bravo provoca enormes prejuízos económicos na agricultura, sendo considerado uma praga em todas as ilhas onde está presente. E é igualmente responsável por diversos outros danos, como os ocasionados sobre as plantas endémicas utilizadas nos programas de repovoamento da floresta nativa.

Sendo o coelho-bravo uma espécie que cria danos irreversíveis no meio natural e uma grave praga para a agricultura, as entidades públicas não devem, como fazem erradamente na actualidade e se reflecte também na presente proposta, promover a manutenção e a renovação das populações desta espécie em liberdade na óptica exclusiva da sua utilização cinegética.

Segundo todos os tratados europeus e internacionais de defesa da natureza assinados por Portugal, é da obrigação e da responsabilidade das entidades públicas reduzir as populações das espécies exóticas invasoras em estado livre até conseguir, tendencialmente, a sua completa desaparição do meio natural.

Os benefícios decorrentes da progressiva desaparição do coelho-bravo, evitando os enormes prejuízos naturais e económicos que origina, seriam sem dúvida muito maiores do que aqueles obtidos na caça.


A obrigação legal de não introduzir espécies exóticas

A perdiz-vermelha (Alectoris rufa) e a perdiz-cinzenta (Perdix perdix), aves próprias do continente europeu, são também espécies exóticas, não pertencentes portanto à fauna açoriana. Apesar de não estarem classificadas como invasoras, como o coelho-bravo, pois até agora não foi demonstrado que criem danos importantes no meio natural, a prática de introduzir espécies exóticas no meio natural é, na actualidade, considerada como um atentado ambiental e contraria toda a legislação nacional e internacional.

Ora, a inclusão na lista de espécies cinegéticas destas duas espécies de perdizes implica necessariamente a intenção de as importar e as libertar no meio natural da nossa região, actuação que, como é dito, contraria claramente as normas jurídicas existentes. Por este motivo estas duas espécies exóticas deveriam ser imediatamente excluídas da lista.


Aves nativas em estado de conservação desfavorável

Existem dados muito preocupantes sobre o estado de conservação e sobre a abundância da narceja (Gallinago gallinago) e da galinhola (Scolopax rusticola), espécies nativas dos Açores que ocupam uns habitats de grande importância ecológica.

Estas duas aves, nomeadamente a narceja, são espécies que se encontram em claro declínio na nossa região, sendo as principais causas da diminuição da sua população a perda do habitat e a pressão cinegética. As populações nidificantes destas espécies são muito reduzidas, no caso da narceja com apenas 278-418 casais para o total dos Açores (Pereira, 2005). E nalgumas ilhas estão já prática ou totalmente desaparecidas.

Devido à sua alarmante situação no nosso arquipélago, perto da extinção, e devido ao tamanho muito reduzido das suas populações e dos habitats que ocupam, estas espécies não atingem as condições de sustentabilidade necessárias para ser consideradas como um recurso cinegético, pelo que deveriam ser excluídas definitivamente da lista de espécies cinegéticas.


Aves nativas migradoras de habitats aquáticos

As três espécies de patos consideradas na proposta, o pato-real (Anas platyrhynchos), a marrequinha (Anas crecca) e a piadeira (Anas penelope), são aves principalmente migradoras que nos Açores ocupam os escassos habitats de água doce presentes na região, como são as lagoas e os charcos de maior dimensão.

Para além dos efeitos que a caça pode ter sobre estas três espécies, o exercício da caça nestes habitats aquáticos provoca uma enorme perturbação e um muito elevado impacto no conjunto da fauna que os ocupa. Nomeadamente sobre um elevado número de espécies de aves migradoras, todas elas protegidas, que ocupam estes habitats e que se encontram já de por si muito enfraquecidas pelo enorme esforço da migração, precisando de uma absoluta calma para se alimentar e poder sobreviver.

A caça nestes habitats constitui ainda um enorme entrave para o turismo de observação de aves, actividade económica em grande crescimento na nossa região. A observação das numerosas espécies migratórias que utilizam estes valiosos meios aquáticos possui um grande interesse turístico, sendo o desempenho desta actividade económica abertamente incompatível com o exercício da caça.

A estes problemas acrescenta-se ainda a contaminação das águas por causa do chumbo dos projécteis utilizados na caça, metal que provoca a doença do saturnismo que afecta a animais e a pessoas. A actual proposta só trata muito timidamente este assunto proibindo a utilização de cartuchos com projécteis de chumbo “aquando da caça em zonas húmidas protegidas” a partir de 2019.

Para além destes impactos ambientais, económicos e ecológicos, deve ainda considerar-se que no passado foram registrados alguns casos de reprodução destas três espécies de patos nas nossas ilhas, o que poderá voltar a acontecer se for eliminada a perturbação dos exemplares e os seus habitats. De qualquer forma, estas três espécies estão presentes nos Açores sempre em números muitíssimo reduzidos, pelo que está claro que também não atingem as condições de sustentabilidade necessárias para ser consideradas como um recurso cinegético e deveriam ser excluídas da lista de espécies cinegéticas.


A caça acidental de espécies protegidas

Das aves classificadas como cinegéticas na proposta, quatro possuem espécies aparentadas, muito próximas, que aparecem também com frequência como migradoras nos Açores: a narceja-americana (Gallinago delicata), o pato-escuro-americano (Anas rubripes), a marrequinha-americana (Anas carolinensis) e a piadeira-americana (Anas americana). Estas espécies aparentadas têm um aspecto muito semelhante às outras, sendo com frequência praticamente impossíveis de diferenciar, mesmo para pessoas com experiência.

Pelo facto de serem quase indistinguíveis, a caça das quatro espécies incluídas na proposta implica inevitavelmente a caça involuntária destas outras quatro espécies próximas, que estão estritamente protegidas e cuja caça é considerada como um delito (a própria proposta propõe uma coima de entre cem e dois mil quinhentos euros para estes casos). Ignorando de forma absurda esta circunstância, a proposta é completamente incoerente nos seus propósitos, convertendo, na prática, espécies protegidas em cinegéticas e caçadores em delinquentes.


Métodos de caça inapropriados

Por ser desnecessária, surpreende a regulamentação nesta proposta de métodos de caça sem nenhuma tradição nos Açores, como são a caça com arco ou besta, ou a caça com aves de presa. Ou também a insistência na utilização do furão ou de negaças vivas em determinados métodos de caça.

A utilização de aves de presa implica a manutenção em cativeiro de exemplares destas espécies protegidas, para os quais será preciso manter custosas instalações que correspondam a umas condições dignas de cativeiro. Para além disso, quando utilizadas na caça, é muito frequente o escape ou perda de exemplares, que são assim introduzidos no meio natural, com todos os riscos que isto comporta.

O furão é também uma espécie exótica invasora que infelizmente já conseguiu estabelecer-se em liberdade nos Açores, sendo a sua utilização na caça a principal causa da sua introdução e presença no nosso meio natural. É portanto de toda lógica a proibição da sua utilização como método de caça.

A utilização de patos e pombos vivos como negaças é eticamente reprovável e parece uma prática completamente desnecessária existindo negaças artificiais. Igualmente cruel e desumana é a autorização feita para, nos campos de treino de caça, largar exemplares de “espécies cinegéticas de cativeiro e variedades domésticas de pombo-das-rochas” para serem mortas “no próprio dia”. Outro método de caça que tem sido igualmente referido pela sua crueldade é a caça a corricão do coelho-bravo, sem utilização de arma de fogo.

Ainda, o texto da proposta resulta confuso quando, sem diferenciar entre espécies exóticas ou nativas, fala de “correcção de densidade” de espécies cinegéticas. O controlo populacional pode fazer sentido referido a espécies exóticas invasoras como o coelho-bravo, mas não é aplicável directamente às espécies nativas, que contam com a sua própria regulação natural dentro do ecossistema.


Actividade duma minoria financiada publicamente

O Governo Regional, através dos Serviços Florestais, está já a criar, ou pretende criar, exemplares de codorniz, perdiz-vermelha, perdiz-cinzenta e pato-real para os libertar no meio natural com a finalidade de potenciar o exercício da actividade cinegética. Custa perceber a razão pela qual tanto dinheiro, equipamentos e funcionários públicos são utilizados para benefício da minoria de pessoas que pratica este tipo de caça.

Como já foi referido, esta situação é grave nomeadamente no caso da perdiz-vermelha e da perdiz-cinzenta, que são espécies exóticas que nunca deveriam ser introduzidas no meio natural, e ainda menos por uma entidade governamental. Da mesma forma que é também incompreensível a actual cria e libertação nas ribeiras e lagoas dalgumas ilhas açorianas, por parte dos Serviços Florestais, da truta-arco-iris, também ela considerada como uma das cem das piores espécies exóticas invasoras a nível mundial.

O escasso benefício destas actividades minoritárias, altamente subsidiadas, contrasta claramente com o impacto negativo que exercem sobre outras actividades económicas muito mais importantes para a nossa região e para a maioria dos açorianos, como é por exemplo o turismo. Um impacto que resulta ainda maior quando a caça é praticada na proximidade dos trilhos pedestres, levando a evidentes riscos para a segurança dos praticantes do pedestrianismo, ou também quando se pretende abrir o período venatório ainda nos meses do verão, quando há grande presença de turistas.


A necessidade duma nova proposta legislativa

Por todas as razões citadas, é necessária uma viragem na política praticada até agora à volta da actividade cinegética nos Açores. Esta prática deve ter uma correcta adequação à realidade açoriana, com uma necessária modernização dos conceitos e uma reconfiguração dos seus objectivos. É igualmente imprescindível valorizar a fauna açoriana frente a determinados interesses económicos elitistas, apostando claramente em sectores económicos de futuro, compatíveis com o respeito integral pelo ambiente e pela natureza.

Como conclusão, deve exigir-se a retirada da actual Proposta de Decreto Legislativo Regional feita pelo Governo Regional e a sua reformulação numa nova proposta que considere um maior grau de conhecimento científico, o cumprimento dos tratados internacionais e um maior cuidado e respeito pela sempre frágil, única e irrepetível natureza dos Açores.




ASSOCIAÇÕES E GRUPOS ECOLOGISTAS:

Amigos dos Açores – Associação Ecológica
Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza / São Miguel
Coletivo Açoriano de Ecologia Social
Avifauna dos Açores


APOIOS INDIVIDUAIS (>350 pessoas):

Plataforma change.org: ver aqui






26/09/2017

Identificada nova espécie de ave dos Açores provavelmente extinta pelo homem


Uma nova espécie de ave, já extinta, foi recentemente encontrada e identificada no arquipélago dos Açores. Esta nova espécie, denominada como Priolo-grande (Pyrrhula crassa †), vivia pelo menos na ilha Graciosa, onde foram agora encontrados vários dos seus restos ósseos preservados no interior duma gruta vulcânica.




Esta nova espécie pertence ao mesmo género que o Priolo (Pyrrhula murina), espécie da qual apenas sobrevive uma reduzida população, grandemente ameaçada, no leste da ilha de São Miguel, dentro do mesmo arquipélago. E também que o Dom-fafe (Pyrrhula pyrrhula), ave amplamente distribuída pelo continente europeu e asiático.

O Priolo-grande tinha no entanto um tamanho maior do que os seus parentes, como revela o maior comprimento dos restos ósseos encontrados. Mas desconhece-se qual seria, na realidade, a cor das suas penas e o seu aspecto externo.

A desaparição ou extinção desta espécie endémica dos Açores parece coincidir com a chegada dos colonizadores portugueses ao arquipélago. E também com a desaparição de outras quatro aves endémicas: três frangos-d'água (Rallus carvaoensis, R. montivagorum e R. nanus) e um mocho (Otus frutuosoi), dos quais foram igualmente encontrados restos ósseos em várias ilhas dos Açores.

A desaparição destas espécies é portanto muito provavelmente devida à chegada do homem aos Açores, que teve como consequência a destruição de muitos dos habitats originais. E também a introdução nas ilhas de diferentes espécies exóticas invasoras, como gatos ou ratos, que são responsáveis pela maioria das extinções acontecidas em ilhas oceânicas de todo o mundo. Os gatos, por exemplo, são responsáveis pela desaparição de 22 aves, nove mamíferos e dois répteis em diferentes ilhas oceânicas, um 14% do total mundial das extinções de vertebrados.

Com o descobrimento destas espécies ficamos com uma ideia melhor e mais completa sobre o que era a autêntica riqueza e biodiversidade destas ilhas, infelizmente em grande medida perdida para sempre.

REFERÊNCIA:
J.C. Rando, H. Pieper, Storrs L. Olson, F. Pereira e J.A. Alcover. A new extinct species of large bullfinch (Aves: Fringillidae: Pyrrhula) from Graciosa Island (Azores, North Atlantic Ocean). Zootaxa 4282 (3): 567–583.




19/01/2017

Abates de gaivotas sem necessidade de autorização


A Gaivota-dos-Açores (Larus michahellis atlantis), uma subespécie endémica de gaivota do nosso arquipélago, pode ser abatida legalmente sem necessidade de autorização por parte de aterros e aeroportos!


Segundo declarações do Director Regional do Ambiente,"as entidades gestoras destas infraestruturas podem fazer controlos selectivos das populações de gaivota e o abate é permitido com recurso a arma de fogo, sem necessidade de autorização".

No entanto, segundo a Inspeção Regional, não são permitidos “métodos não selectivos, como é o caso de envenenamento, que comportam riscos biológicos e introdução em cadeias alimentares e riscos de saúde pública, entre outros". Esta prática é considerada uma contra-ordenação ambiental grave. Por causa disso, a Associação de Municípios de São Miguel, que recentemente envenenou gaivotas com iscos com pentobarbital sódico, vai sofrer agora um processo de contra-ordenação que pode culminar com coimas que vão dos 12 aos 216 mil euros.



(Fonte: Correio dos Açores, 19 de Janeiro de 2017)